sábado, 30 de maio de 2009

Um grito de silêncio

Sabe quando simplesmente a sua cabeça está tão cheia de pensamentos e idéias que você nem consegue vê-los separadamente com clareza? Então, hoje é um desses dias, confusões me perseguem e me enlouquecem, não sei o que fazer, claro que não, nem ao menos sei o que se esconde nesse emaranhado em minha mente, não sei que questões me afligem ou irritam, como saberia a posição a tomar?

Pois é, em geral eu, do jeito que sou quando tenho uma confusão dessas sento calmamente em meu canto e escrevo, escrevo até que as idéias se dissociem e a confusão se desfaça. Mas me vi então sentada no ônibus voltando para casa depois de um exaustivo dia de trabalho confusa, aflita, nesse estado de espírito aí de cima, cabeça cheia, emaranhado, idéias em profusão, sentimentos brotando, nascendo, correndo e desaparecendo antes que eu tenha tempo de identificá-los, organizá-los e até usá-los a meu favor.

Eu no ônibus, sem caneta, sem papel, em um veículo em movimento, sem possibilidade de escrever, sem achar meio de extravasar a angústia. Eis que me surge uma idéia, idéia que se sobrepõe a todas as outras e se revela a mim em todo seu esplendor. E ela não apenas se revela como se impõe, sinto então a vontade incontrolável de realizá-la, a vontade incontrolável de gritar. Sim, gritar para extravasar, essa foi a idéia. Não digo que foi genial nem mesmo original, mas foi o que eu, com o cérebro já lotado consegui.

Olho ao redor, um casal troca juras de amor no banco da frente, um velinho dorme de boca aberta, a baba já escorrendo, um homem fala no celular mais adiante, outro olha pela janela, um terceiro batuca impaciente com os dedos em uma pasta amarela, uma mulher parece pensar na vida, atrás de mim um sujeito lê o jornal, todos gozando a calma e o silêncio parcial da viagem (é, executando-se o som dos carros, das buzinas e pessoas na rua a viagem é silenciosa). Tenho certeza que todos ali se incomodariam e até se assustariam se uma mulher aparentemente calma que aprecia a paisagem simplesmente soltasse um grito, não um gritinho de medo ou nojo, mas um grito lá do fundo do meu ser, um grito de libertação, alto e contínuo. Por isso me reprimo, empurro com força essa vontade para o fundo da mente, tento pensar em outras coisas, mas minha mente continua confusa, continua no caos.

A fim de me distrair começo a pensar onde que desejaria estar para que o tal grito da esperança pudesse ser dado. No meio de uma floresta, eu uma clareira no campo, num deserto, numa praia deserta, numa trilha vazia na montanha, numa cidade fantasma, nas ruínas abandonadas de um antigo palácio. Sim, qualquer desses lugares seria perfeito, mas não é isso que desejo, quero encontrar um lugar real, um lugar que eu possa ir, que exista e não algo imaginado ou distante como... a floresta amazônica.

Penso nos lugares que freqüento, meu quarto, minha casa, o trabalho, a faculdade, casa de amigos ou parentes, as ruas que ando diariamente, e meus refúgios, uma praia menos movimentada, um parque pertinho da minha casa, um ou outro bar ou restaurante. É, nenhum desses lugares permitiria meu grito, me afasto de minha esfera cotidiana, penso em outros lugares da cidade, outras casas, outros parques, outras praias. Não, não há lugar em que seja permitido esse grito de libertação que desejo dar, os locais acessíveis simplesmente não nos permitem esse... “acessos de loucura”, querem que sejamos sempre aparentemente normais, comportados, seguindo padrões de aceitação impostos.

Olho pela janela novamente, meu ponto se aproxima, puxo a cordinha e desço, olho ao redor, o que os vizinhos diriam se eu soltasse o tal grito? Me tachariam de louca? Me mandariam para um manicômio? Não sei, mas também não arrisco, caminho lentamente para minha casa, as idéias ainda em turbilhão na minha cabeça, pego o elevador, quem sabe no elevador? Todos os vizinhos ouviriam e ficariam a se perguntar de onde viera tal grito, quem o produzira, portas se abrindo em todos os andares, olhares curiosos, achei melhor não tentar. A chave entra na fechadura e destranca minha porta, vou para o meu quarto, sei que de minha boca fechada esse grito não sairá, vou até a mesa e me sento, caneta na mão direita, papel sobre a mesa. Escreverei, pelo menos é socialmente aceitável, me conforta e é o que sei fazer.

2 comentários:

  1. Caminhe.....simplesmente...caminhe ...sempre em frente......as vezes de um passo atras.....mas depois...se esforce e de dois passos avante.....mas continue caminhando ....independente dos obstáculos..Keep Walking....

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  2. Canta! coloca uma música boa e canta. a música disfarça um pouco que o sofrimento é da gente. gostei desse, Ju! Adoro essas coisas que sufocam.

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